Gestão

Estudo indica tendência global da prática de sucessão planejada para CEOs

de Karin Hetschko em 10 de junho de 2015

Goizueta (dir.) não preparou seu sucessor, Ivester (esq.). Resultado: queda nas ações da Coca-Cola

Um grande golpe abateu a gigante Coca-Cola em 2004. À época, o executivo australiano Douglas Daft anunciou sua pretensão de se aposentar e deixar a cadeira de presidente mundial da empresa. Até aí qual era a grande anormalidade do caso? Todas as companhias passam por processos de sucessão. Acontece que de 1997 a 2004 a Coca-Cola esteve sob a tutela de três CEOs: Roberto Goizueta, Douglas Ivester e o próprio Daft. E mais um quarto viria preencher essa lista.

Tudo começou com a morte repentina de Roberto Goizueta, vítima de um câncer no pulmão. Goizueta consolidou a marca mundialmente, mas cometeu um grande erro: não preparou um sucessor. Douglas Ivester, o então diretor financeiro do grupo, foi promovido para substituí-lo, teve um mandato curto e tumultuado — durante seu reinado, o valor das ações da Coca-Cola caiu 50%. Em seu lugar, foi alçado ao cargo Douglas Daft, então com 56 anos, 31 deles como funcionário da empresa e responsável pelos negócios da Coca-Cola na Ásia. O executivo foi responsável por um novo fôlego na companhia, mas cinco anos depois ele resolveu sair. E todo aquele processo desgastante de procurar um novo CEO seria retomado.

Essa breve história da sucessão na Coca-Cola resume um problema que o mercado agora enfrenta com certo profissionalismo: a sucessão de presidentes e CEOs. Na época em que os problemas começaram na multinacional de bebidas, poucas empresas pensavam na sucessão de executivos. Um levantamento global da Strategy&, o Estudo anual de CEOs, Governança e Sucesso indica que, entre 2000 e 2002, apenas 63% das empresas pesquisadas se preocupavam com o tema. A boa notícia é que esse índice subiu para 82% no levantamento de 2012 e 2014. Em 2014, os números globais reforçam a tendência de crescimento: 86% das trocas foram planejadas e apenas 14% foram forçadas (ocorreram de repente).

“Começamos a observar, ao longo do tempo, que as empresas estão preferindo planejar essa passagem de cargos”, indica Carlos Eduardo Gondim, vice-presidente da Strategy& no Brasil. Segundo o executivo, há uma razão lógica para o uso da estratégia: menor perda de valores de ações da companhia. “Estudos indicam que numa sucessão repentina, em média, as empresas perdem 1,8 bilhão de dólares a mais do que numa sucessão planejada.”

Maior permanência

Na maioria das empresas (78%) que promoveram a troca de CEOs no ano passado, o cargo foi assumido por alguém de dentro da organização. “Esta é uma quantidade saudável para sucessões internas e que apresenta algumas vantagens. Observamos que, em 10 dos 15 anos analisados pelo estudo, os CEOs que são promovidos internamente permanecem no cargo por um pouco mais de tempo e entregam valor total (anualizado e ajustado regionalmente) mais alto para os investidores ao longo do seu tempo na função”, afirma Paolo Pigorini, managing director da Strategy& para a América do Sul.

O Brasil, no entanto, rumou na direção contrária no último ano. Em 2013, 70% das companhias optaram por executivos “da casa”. No ano passado, essa porcentagem caiu para 56%, bem abaixo da média global. Por conseguinte, a porcentagem de executivos chamados de outsiders (os de fora, na tradução para o português) vem crescendo: 44% dos novos CEOs do país vieram de outras empresas, contra os 22% registrados globalmente. “Essa movimentação é interessante, uma vez que, além de os novos CEOs virem de outras empresas, muitos atuavam em outras indústrias”, ressalta Gondim.

Para Pigorini, as empresas têm dado uma atenção maior à questão sucessória, trazendo-a para o cotidiano ao invés de ser uma preocupação exclusiva para a hora da mudança. “Quando planejam bem a sucessão, as companhias colocam o assunto da governança de CEO na agenda corrente das reuniões de conselho e trabalham para se antecipar aos problemas antes que eles se tornem mais sérios”, afirma.

“Centenas de bilhões de dólares em valor potencial no futuro estão dependendo do quanto as maiores empresas podem melhorar suas práticas de sucessão nos próximos anos”, completa o executivo.

Outros achados

No que diz respeito ao tempo do executivo exercendo a função, os dados do Brasil são inferiores à média global: 4 anos no Brasil, em comparação com os 5,3 anos registrados nos dados globais. O maior tempo de permanência na função foi de 7,8 anos, registrado nos Estados Unidos e no Canadá.

Quanto à faixa etária, pela primeira vez os executivos brasileiros promovidos ao cargo de CEO ultrapassaram a média global, de 52 anos, para dar espaço a pessoas a partir dos 53. Os demitidos ou realocados são mais jovens: têm cerca de 50 anos, oito a menos do que em outros países. Em termos de nacionalidade, o Brasil dá preferência a executivos nascidos no país: 81%, uma porcentagem também alinhada com as tendências globais. Em 2014, 85% dos CEOs contratados no mundo eram do mesmo país de suas respectivas empresas.

Rotatividade

As empresas brasileiras também estão sofrendo menos rotatividade no cargo de CEO. De uma média de 21,8% de contratações registradas em 2013, os dados referentes a 2014 apontam uma queda para 10%, a menor já registrada no país nos últimos cinco anos — no mundo, essa taxa foi de 14,3% em 2014 (estável em relação aos 14,2% registrados em 2013).

“A queda do número de sucessões de CEOs no Brasil aconteceu pelo período de crise e incertezas que estamos vivendo. Os conselhos tornam-se mais conservadores e promovem menos mudanças”, diz Carlos Eduardo Gondim, sócio da Strategy& no Brasil.

Quando se trata de governança, de acordo com o estudo, o Brasil usa de forma correta os mecanismos disponíveis. Em 2014, nenhum novo CEO brasileiro foi apontado também como chairman (presidente do conselho). Essa prática é mais corrente em outros países, resultando em 10% das empresas globais avaliadas pelo estudo. O “apprenticeship model” — em que o CEO antigo vai para o conselho e dá apoio ao novo CEO em sua transição — acontece em pouco menos da metade dos casos (40%).

 + Metodologia
A Strategy& identificou as 2.500 maiores empresas de capital aberto do mundo, definidas por sua capitalização de mercado (pela Bloomberg). A partir daí, detectou as empresas dentre as 2.500 que haviam passado por um evento de sucessão de seu executivo-chefe e cruzou os dados.

 

 CEOs com MBA
> Em 2013, 28% deles possuíam essa especialização; hoje, são 44%. No Brasil, 38% dos altos executivos têm esse tipo de formação.

 

 Mulheres em cargos de liderança
> 5,2% dos executivos contratados para esse cargo no ano passado são do sexo feminino, mais do que os 3,1% registrados pela pesquisa em 2013. É a maior taxa global de CEOs mulheres dos últimos cinco anos.”Este é um movimento natural; mulheres mais bem preparadas têm  o direito de serem indicadas  para o cargo de CEO”, analisa Gondim

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