Carreira e Educação

Uma realidade bem próxima

de Leandro Quintanilha em 17 de dezembro de 2015

As novas tecnologias consolidam a educação a distância (EAD) no Brasil, formato que já existia desde os cursos por correspondência do Instituto Universal Brasileiro, a partir de 1941, e o Telecurso Segundo Grau (TV Globo), desde 1970, entre outras iniciativas pioneiras. O fato é que, hoje, com internet rápida, instituições de renome oferecem não apenas cursos superiores, mas também pós-graduações e MBAs online em larga escala. Como funcionam as opções disponíveis? Como o mercado recebe esse tipo de formação? A que tipo de público se destinam produtos nesse formato? Essas questões serão respondidas de forma mais detalhada ao longo deste texto, mas já é possível adiantar que o cenário é positivo e promissor.

A Associação Brasileira de Ensino a Distância (Abed) promove regularmente uma investigação sobre os caminhos desse tipo de educação no país. Em um levantamento realizado em 2013 e 2014, o Censo EAD.BR, foram consultadas 309 instituições, entre universidades e fornecedores de produtos e serviços relacionados ao formato. Foram catalogados 15 mil cursos, com quase 4 milhões de alunos. Para 82% das instituições participantes, a previsão era de crescimento, mesmo em um cenário político-econômico hostil. Os cursos de pós-graduação, especificamente, apresentaram um grande potencial de crescimento. Enquanto a média na graduação (bacharelado e licenciatura) é de 1.860 alunos por curso (tendo em vista que não é necessário comportar todos ao mesmo tempo em uma sala de aula), nos MBAs, por exemplo, há apenas 206 por empreitada.

A atual crise econômica pode, na verdade, afetar positivamente a procura por pós-graduações online. Diante do aumento do dólar, profissionais brasileiros que sonhavam com temporadas de aprendizado no exterior têm reformulado seus planos e podem optar por cursos de grandes universidades internacionais a distância.

No Brasil, os cursos de EAD repetem a prevalência feminina das graduações e pós-graduações presenciais – nas formações online, elas representam 56% dos participantes, mas a pesquisa aponta algumas diferenças importantes: o alunado é mais maduro (estudantes entre 31 e 40 anos predominam em 60% das instituições) e ocupado (90% precisam conciliar a formação com o trabalho). No caso de pós-graduações, o percentual de alunos empregados foi de surpreendentes 100% no Censo EAD.BR 2013/2014. Por isso, o antigo preconceito contra formações a distância no mercado de trabalho não faz lá muito sentido, porque esses estudantes já integram esse mesmo mercado.

Há uma grande diversidade no perfil institucional e geográfico dos projetos de EAD praticados no país. A região Norte, por exemplo, com 84% dos cursos realizados na esfera pública federal, contrasta com o Sul, com 91% dos cursos na esfera privada. O que não muda é que essas instituições têm investido cada vez mais em vídeos,  games e outros produtos que fogem do escopo da educação tradicional. Quase 80% dessas universidades já dispõem de equipes tecnológicas próprias e focadas. Vídeos de 10 minutos e jogos online tornaram-se ferramentas paradigmáticas.

“Cada vez mais, as pessoas se dão conta de que, mais importante que o formato, é a credibilidade da instituição do ensino”, afirma Luciano Sathler, diretor da Abed e diretor de EAD da Universidade Metodista, da Grande São Paulo. “Acredito que, nos próximos anos, será muito difícil diferenciar educação presencial e a distância, porque as metodologias de ensino de maneira geral precisam incorporar a tecnologia.”

Para a especialista em RH (e em geração Y) Eline Kullock, do Grupo Foco, a consolidação das formações online está ligada às transformações pelas quais a cultura e a sociedade têm passado com o advento da internet. Pesa o fato de que a locomoção nas grandes cidades é cada vez mais penosa, custosa e demorada, mas também a necessidade de atualização constante ao longo da carreira. Mesmo profissionais bem-sucedidos, que já ocupam cargos de comando, precisam se qualificar periodicamente e o formato online, flexível por natureza, pode favorecer o encaixe de novos conteúdos em uma agenda conturbada.

“Ao mesmo tempo, as instituições de ensino se desvencilham dos gastos dos cursos exclusivamente presenciais”, lembra Eline. Outro ponto é que as ferramentas utilizadas pelo ensino a distância combinam melhor com o perfil de aprendizado das novas gerações. “Os smartphones são um recurso de bolso que pode fazer de qualquer pessoa um aluno permanente”, ilustra Stavros Xanthopoylos, diretor-executivo da FGV Online, o braço de EAD da Fundação Getulio Vargas, de São Paulo.

Como funciona?

De fato, a pesquisa da Abed mostrou que vídeos e games de curta duração despertam muito mais interesse entre o alunado do que aulas expositivas tradicionais. Esse conjunto de razões, das diferentes partes envolvidas, fortalece a preferência pela EAD ao longo do tempo.

Os cursos a distância combinam atividades online e offline, por determinação do Ministério da Educação (MEC). Todas as provas ocorrem presencialmente. Além delas, outras atividades também precisam ocorrer offline, como aulas especiais, debates e seminários, entre outros. Há ainda uma outra divisão, entre atividades síncronas e assíncronas, como explica Stavros. As primeiras são aquelas feitas em horários predeterminados, em contato com o professor e, por vezes, também com a turma. As atividades assíncronas, por sua vez, são aquelas que podem ser feitas a qualquer momento pelo aluno, como assistir a uma videoaula ou realizar atividades individuais de estudo, on ou offline.

“É preciso lembrar que somos seres sociais”, destaca Eline. “A evasão nas formações presenciais se dá porque o aluno se sente sozinho no grupo – essa sensação também pode ocorrer nas versões online, naturalmente.” Para a especialista, esse isolamento é um fenômeno social contemporâneo, fruto de um tempo que não estimula vínculos. Nesse contexto, cabe às universidades e aos professores estimular situações e atividades de integração. Porque o encontro com colegas, ao mesmo tempo que proporciona a criação de novos contatos profissionais (mesmo porque se trata de um público que já faz parte do mercado, muitas vezes em posições estratégicas), também é uma fonte de motivação para seguir em frente com os estudos. Colegas trocam experiências, compartilham vulnerabilidades e se ajudam.

Mas como manter o ritmo de estudos em um curso a distância? “O próprio calendário dá essa tônica”, afirma Stavros, da FGV Online. As provas ocorrem periodicamente em datas predefinidas – os alunos precisam, portanto, manter uma rotina de estudos para acompanhar o curso. Na FGV, a taxa de evasão dos cursos online é um pouco menor que a dos presenciais, mas ambas ficam em torno dos 10%. “Pouca gente desiste também pelo fato de que se trata de um investimento alto.” Quando um aluno se ausenta das atividades síncronas ou deixa de comparecer aos encontros presenciais, a instituição entra em contato para identificar o problema e persuadi-lo a retomar os estudos.

De maneira geral, os cursos de pós-graduação mais procurados a distância são de administração, economia e marketing. Na FGV, o MBA a distância mais popular é o de gestão empresarial, mas o diretor percebe uma forte tendência de crescimento do de gerenciamento de projetos, em resposta a uma demanda do mercado. É que empresas de hoje têm se moldado para gerenciar quase tudo como projeto, tirando proveito da eficiência dessa sistematização em diferentes áreas de atuação, internas e externas.

Processo de adaptação

O engenheiro Marcelo Luis Cerqueira, de 48 anos, trabalha como coordenador de propostas em uma grande construtora. No ano passado, ele ingressou no curso de MBA Executivo Internacional em gerenciamento de projetos da FGV. “É engano pensar que a versão online seja fácil de ser acompanhada ou que podemos fazer o que bem entendermos com os estudos”, diz.  “Conciliar a rotina acadêmica com o trabalho não é simples e, no início do curso, a demanda parecia de difícil execução”, lembra. Com o passar do tempo, o curso não ficou mais fácil, mas Cerqueira aprendeu a lidar com a rotina puxada. “Não esperava que o MBA exigisse tamanha dedicação pessoal”, diz. Mas ele soube se adaptar. O engenheiro afirma que nunca sofreu preconceito por estudar a distância, por dois motivos: a escolha de uma instituição de renome e por ele mesmo demonstrar empenho e seriedade nos estudos. Seu MBA deve ser concluído em março de 2016, sem atrasos.

No futuro, profissionais como Cerqueira podem procurar especializações mais próximas de sua graduação original. Apesar da preponderância dos cursos de gestão e marketing nas pós-graduações a distância hoje, Eline Kullock prevê um grande potencial de crescimento para áreas mais técnicas nos próximos anos, como as engenharias. É mais uma questão de tempo para que essa cultura de formação se propague para todas as áreas do conhecimento.

Os especialistas também acreditam que o preconceito residual de hoje contra profissionais que se qualificam a distância pode ser não apenas superado, mas substituído por uma preferência entre os recrutadores. Stavros Xanthopoylos afirma que, em países da América do Norte e da Europa, candidatos que estudaram remontamente podem ter vantagem em processos seletivos. “O formato escolhido pode funcionar como critério de desempate”, garante. Isso porque a formação online requer ferramentas pessoais muito valorizadas pelo mercado, como autonomia, organização, disciplina e perseverança.

Ementa de vantagens 
Flexibilidade
Boa parte das atividades de uma formação online podem ser executadas a qualquer momento do dia, ou concentradas no fim de semana.

Tecnologia
Vídeos, games e outras plataformas tornam a experiência de estudar mais estimulante e variada. Assim, o processo de formação se torna mais dinâmico e menos repetitivo.

Portabilidade
Celulares, tablets e notebooks levam professores e bibliotecas aonde quer que se vá. É possível estudar no transporte público e mesmo na sala de espera do dentista.

Custo-benefício
Por dispensar a estrutura de aulas exclusivamente presenciais e pela possibilidade de reaproveitar  conteúdos já formatados, formações a distância são mais baratas.

Acesso
Profissionais de todo o país podem buscar qualificação em instituições distantes de sua cidade e mesmo em outros países.

 

Manual do aluno 
â–º Para o mercado de trabalho, a credibilidade da instituição de ensino é mais importante que o formato. Por isso, pesquise sobre as opções disponíveis antes de escolher a universidade. Observe o conteúdo programático e o quadro de professores. Se possível, converse com pessoas que já passaram pela experiência na instituição pretendida.

â–º Estudar a distância pode exigir mais empenho do que se formar pelo modo convencional. Não há piloto automático. O estudante de EAD precisa ser organizado e disciplinado para não perder o ritmo – ou chegará despreparado às provas presenciais. É muito importante acompanhar o cronograma previsto pela instituição.

â–º Mantenha uma rotina de estudos. É preciso separar um determinado número de horas de segunda a sexta e/ou aos fins de semana, para assistir às aulas e realizar as atividades relacionadas. Avise a família para não perturbá-lo e encontre um lugar adequado em casa para que possa se concentrar. Mas não fique confortável demais, para não cair no sono.

â–º Concentre-se. Evite checar e-mails do trabalho ou notificações nas redes sociais durantes os horários reservados ao estudo. Essas interrupções afastam você do conteúdo que precisa assimilar, além de conduzi-lo a um estado mental ansioso, que só prejudica o processo de aprendizado.

â–º Aproveite os momentos de contato com colegas, em seminários, debates e eventuais trabalhos em grupo. Além de novos contatos profissionais, eles podem ajudar você a experimentar outros métodos de estudo e aprendizado. E também a relaxar um pouquinho, de tempos em tempos.

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